Indecisa. Achei que tivesse virado um fantasma nas últimas semanas. Tinha medo de fechar os olhos e não te encontrar mais. Passei a noite em claro acendendo e apagando a luz do abajur, vendo a caneta se virar de um lado para o outro com simulada displicência. Sobre a escrivaninha, uma fila de rabiscos que dobravam os quarteirões, tentando decifrar um fio de voz que parecia vindo de uma cisterna abissal. Como é difícil calar a voz de dentro. Mas não consigo me arrepender das decisões que tomei em relação ao amor. Elas me levaram até você. Às vezes fico tateando o escuro, à procura de palavras que se derramam pelos cantos da boca como uma nascente de cobre líquido. Não existem. Tenho medo de me calar e as palavras acabarem morrendo em meus lábios, esfarinhando-se em sopros de sombra inclinados. Há paixões que honram quem as inspira. Quando voltar, a gente podia se ver no mar. Naquele tom azul celeste que você tanto gosta. Mergulho no passado, recordando-me do naufrágio de nossas vidas. Nado contra a maré, que me leva insistentemente para o lugar onde havíamos estado. Naquele mesmo mar de esperanças que refluem dia após dia, afastando-nos do ponto final. O coração é a única coisa que nos une. Cada batida é uma martelada surda que lança nos ares uma poeira reluzente de lapidação de esmeraldas. E para onde quer que eu vá o pó colorido das boas lembranças que conservo de nós dois, rebrilha. Vou indo, amor. Preciso terminar a sua estátua. Não quero acordar amanhã e pensar em você como se nunca tivesse existido. Vou imortalizá-lo em mim para que nada mais possa nos separar. Esta ausência é só um pesadelo amor, vou estar aqui quando você acordar. Tem dias, que meus olhos escurecem como se não tivessem fundo. Dói. Mas recobro a serenidade e descubro que dor é a única certeza de que este amor ainda está vivo. E nós, só estamos aqui para possibilitar.
P.S.: Eu te amo, amor. Em agosto, te amarei ainda mais.
(Pipa – agentepodiasevernoar.blogspot.com)
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